2018 | 5 planos para construir juntos

plano de envio
escrever uma carta juntos.
contar a alguém de fora da cidade como está a vida aqui. finalizar o plano postando juntos a carta no correio mais próximo.

plano do dinheiro
trazer 10 reais em espécie.
juntar o dinheiro de todos e decidir coletivamente o que fazer com ele. realizar o plano.

plano de transporte
trazer uma planta para ser transportada pela cidade.
decidir com todos um trajeto e um destino final comum. executar o plano juntos.

plano de composição
compor uma canção juntos.
escolher um lugar e cantar publicamente.

plano de escuta
trazer uma música em qualquer mídia.
ouvir juntos todas as músicas trazidas.

planos renata roel e fernando de proença
colaboradoras dani lima e eleonora fabião
fotos e vídeos lidia ueta
interlocução amabilis de jesus

Agora quando escrevo este texto estamos a 2 dias das eleições. O Brasil está dividido. Estamos atravessados por sentimentos intensos e confusos, sem saber para onde vamos todos nós, 200 milhões de pessoas, sem saber o que poderemos fazer, como iremos viver, quando a possibilidade de argumentar e decidir sobre nossos modos de vida parece estar em jogo. Agora quando escrevo este texto é início de setembro de 2018 e estamos na Casa Hoffmann experimentando equilibrar fluidos e membranas. Estamos num pequeno café na esquina das ruas João Gualberto e Augusto Stresser. Tomamos café e conversamos sobre corpos de baile, levantes e disparates, sobre o desejo de estar na rua, sobre construir coisas com outras pessoas. Que coisas? Fernando fuma cigarros na calçada. Renata gosta de frequentar o baile dos solitários. Eu faço perguntas. Fernando quer fazer convites diretos e simples. “Renata deseja tocar o tecido social. Vamos começar agindo e descobrindo. Um lápis colorido é carregado entre eles dois até a XV. Um passante fala de Deus quando o lápis cai. Chove cântaros. O vidro está embaçado. O Museu Nacional está em chamas. Que tristeza. Está difícil dormir. Duas samambaias gigantes me fazem cafuné. O que restou da riqueza dos vínculos construídos? A arte do encontro. A arte da existência. Que existência de arte? Desejo de novas formas de interagir, de experimentar o mundo-cena. Ações que criem vínculos entre pessoas. Agora quando escrevo este texto estamos no Parque Lage e o sol está quente. Arte é sobre tomada de decisões. Eleonora decidiu tomar um suco rosa. A obra é o ato. Um convite ao ato dos espectadores. Coagentes. Vamos tomar decisões juntos. Falamos durante 3 horas. No naboísmo. Perco o meu brinco. Mas afinal, o que vai ser legal para você e para o Brasil agora. Quais são seus planos. O Saara, o Leme, o Centro, as montanhas que parecem corpos atravessados na cidade. Convidar as pessoas para construir o quê? Qual cidade? Qual corpo? Qual relação? O sol desenha um quadrado de luz na parede da Casa Quatro Ventos e agora quando escrevo este texto já estamos em Curitiba de novo. Vamos cochilar uns minutos no gramado do museu. Serão 10 planos. 6 planos. 5. O que nos alimenta hoje. O que nos envenena hoje. Quem estará com a gente. A que família pertencemos? Orquidáceas, cactáceas, bromélias, nephrolepidaceae… Lidia, Cândida, Gabriel, Daiana, Pablo, Vinicius, Fernando, Eleonora, Dani, Renata e quem mais chegar. A arte do encontro. Uma síntese disjuntiva? Convidar pessoas para construir modos de viver. Juntos. Como viver juntos. Qual país?”
Dani Lima
Rio de Janeiro, 26 de Outubro de 2018.

“Praticar o vazio. Jogar na roda ou na mesa as ideias, os desejos e construir pensamentos nas possibilidades de traçar rotas e planejar encontros. Brasil, outubro de 2018. Práticas contínuas estas que também são sobre a ativação do meu-nosso corpo para o possível e o inesperado.Debruçar sobre a criação e lidar com materialidades, praticando gestos como possibilidade de interrupção e abertura para que algo se faça junto – decisões, movimentos e vínculos – faz-nos lidar com o tempo do vazio-cheio no chão da Casa Quatro Ventos, no gramado ao lado do Terminal do Portão e no banco da praça Carlos Gomes faz-nos também equilibrar o lápis com a ponta dos dedos e tentar, driblando a tempestade, atravessar a Rua XV, rumo à Praça Osório. Exercitar gestos como mobilizadores das ideias e sustentar a insistência nas tentativas de convites e encontros aqui parece não ter fim e parece ser também o ponto de partida. Encontrar a justa medida da contenção e da soltura aqui também parece não ter fim. Inventar planos como reinvenções da minha-nossa existência com plantas, dinheiro, canções, músicas e cartas com papéis, escritas, conversas, caminhadas e escuta é o que queremos e podemos fazer agora.Construir atmosferas coletivas no meu-nosso minimundo que está o tempo todo sendo feito das relações e mobilizar aqui, aquilo que sou-somos capazes de imaginar e inventar. A imaginação possibilita invenções, levanta voos cidade afora e estar aqui é afirmar minha-nossa presença engajada numa jornada de desafios sem fim sobre o praticar do mesmo chão e do infinito ou finito que pode brotar desta mesma superfície que pisamos.”
Renata Roel
Curitiba, 23 de outubro de 2018.

“Os planos, multidirecionais e encadeados desde aqui e desde o rio de janeiro, a partir de encontros convidados e um sem fim de negociações, se fazem 5. E se farão 5, junto contigo que, se aceitar estar junto, estará construindo em coletivo uma coisa num infinito de imprevisibilidades do chão que pisamos em novembro de 2018.O desejo de fazer corpo junto de corpos, mergulhando na dramaturgia do convite e incendiando o brilho de estar vivo, ilumina nossos encontros. A partir de uma simplicidade absurda – que se faz coisa com planta, dinheiro, carta, músicas e pessoas -, desejamos disparar, pelo convite, relações. Os planos sonham a nova floração do antiautoritarismo que desfalece aqui, no nosso lugar de vida. Os planos sonham e aguentam e planejam e realizam, mas só se forem matéria viva lidada por gente viva.Os 5 cinco podem ser sobre a arte de negociar. Podem ser sobre ternurar presença. Devem ser sobre encontrar considerando diferenças e escolher como o encontro se transporta. Aconchegamos a Casa Quatro Ventos para receber, preparamos café, fizemos aulas, reuniões, viagem, escolhas, andamos em praças do Centro e cruzamento de bairros, dançamos, lemos e escrevemos, falamos de política e políticos, choramos, rimos, gargalhamos, AMAMOS e nunca trabalhamos tanto para estar juntos.O que podemos construir aqui? Hoje? 2018.
Curitiba. Brasil.  Agora.
Fernando de Proença

“Num momento em que o Brasil está cindido e nossa democracia gravemente ameaçada, num momento em que tantos corpos, vidas e modos de vida estão em cheque, 2 artistas, um ator e uma dançarina, decidem que seu trabalho de arte é promover encontros para que grupos de pessoas desconhecidas pensem e ajam coletivamente. São planos para a realização de ações que habitualmente levamos a cabo sozinhxs, com amantes, amigxs ou familiares – escutar música, juntar dinheiro e utilizá-lo, escrever e enviar cartas, transportar coisas pela cidade afora, inventar canções e cantá-las… Pois, para o duo, neste agora, neste momento crítico, é fundamental que façamos essas coisas da vida coletivamente, que tracemos planos, dialoguemos e tomemos decisões entre concidadãos. Interessa então a dramaturgia do convite e a dramaturgia do encontro – as possibilidades e impossibilidades de troca, as dificuldades e facilidades de convívio, as afinidades e desafinos, os comos e porquês de cada coletivo que se reúne em torno de cada proposta para fazer cidade e fazer vida. A operação é tão crua, tão nua, tão no osso, que chego a pensar: não se trata exata ou simplesmente de “planos para construir juntxs”, mas sim para construir o junto. Os grupos, formados pelo duo e quem mais responda ao convite, debaterão e executarão os planos não apenas para que se faça algo juntxs, mas para que um junto se faça. E não “apesar das diferenças”, mas precisamente por meio delas. Importante chamar atenção para o fato de que não apenas agentes humanos participam do trabalho. A cada plano, matérias humanas e não humanas, animadas e inanimadas, visíveis e invisíveis serão acessadas e será preciso escutar cada coisa e o conjunto das coisas – papel, dinheiro, envelope, caneta, plantas, música, memórias, desejos, perspectivas, mãos, bocas, vozes, toque, mesa, paredes, muros, rua, tempo, corações, pensamento. E assim, com firme fineza seguiremos fazendo arte. E assim, com determinação e arte, seguiremos fazendo democracia.”
Eleonora Fabião
Rio de Janeiro, 22 de outubro de 2018.